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Pedro Mizutani vê recuperação mais acelerada para o setor sucroenergético a partir de 2016

A crise econômica afeta o setor sucroenergético principalmente, dificultando e encarecendo o crédito para as empresas, mas a tendência é de que, após as complicações enfrentadas nos últimos anos, o mercado de açúcar e álcool tenha tempos bastante promissores daqui para a frente.
 
Para o vice-presidente da Raízen, Pedro Isamu Mizutani, o setor deve sentir uma recuperação mais acelerada a partir do ano que vem, graças à melhora do preço do açúcar internacionalmente devido à queda dos estoques e ao aumento da competitividade brasileira, beneficiada pela valorização do dólar frente ao real, o que trará melhor remuneração.
 
Mizutani integra a série de entrevistas especiais do Jornal de Piracicaba com profissionais e autoridades a respeito da crise e seus reflexos na cidade.
 
Como o setor sucroenergético tem sido impactado pela crise econômica nacional?
 
Basicamente, no nosso setor, que é o sucroenergético, dependemos muito de recursos de BNDES (Banco Nacional do Desenvolvimento Econômico e Social) para plantio e trato de cana e essa parte de crédito foi onde a crise mais afetou. Ela fez com que o crédito fosse reduzido em montante, fazendo, com isso, que fossemos tomar crédito no mercado privado. Muitas empresas não tem acesso ao mercado, não é nosso caso, mas os juros ficam caros e há falta de recursos também. A Raízen não sofre com isso, mas o setor sucroenergético sofre muito. A taxa de juros hoje gira em torno de 14% a Selic, essa é a base, mas no mercado elas custam a Selic mais 2% ou 3%, o que daria 17% ao ano. As taxas, quando são subsidiadas, custam em torno de 8% ou 8,5%. Elas continuam nesse nível, porém, o volume de recursos é mais baixo e como a disponibilidade é menor, tem que buscar o restante no mercado. Esse é um dos maiores problemas provocados pela crise. Outro problema que afetou, ao longo do tempo, todo nosso setor, foi o preço da gasolin
a congelado por causa da preocupação do governo com relação à inflação, o que fez com que os preços do etanol ficassem parados, mas nossos custos foram crescendo. Isso não é de agora, já vem ao longo dos quatro últimos anos. Estamos sofrendo com isso, ora porque se tira a Cide (Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico) que é um imposto diferencial da gasolina com relação ao etanol, ora porque se congela o preço da gasolina.
 
O retorno parcial da Cide em janeiro trouxe benefícios para o setor...
 
Trouxe sim. Você teve uma parte da Cide, uma parte do PIS/Cofins e um reajuste do preço da gasolina, isso nos deu um pouco mais de competitividade. Agora, depois de todas voltas desses tributos, o que mais tem nos afetado recentemente é o tempo, que não nos deixa moer a cana. Por um lado (devido às chuvas) você tem a produtividade agrícola maior, mas esse tempo mais chuvoso faz com que a gente tenha menos tempo para processar essa cana, o que atrasa o término da safra e ao mesmo tempo faz com que você deixe mais cana no campo.
 
E quanto à alta recente do dólar, ela ajudou ou prejudicou o setor sucroenergético?
 
A desvalorização do real prejudica o setor em termos de custo, mas em termos de receita, nos dá competitividade, porque o Brasil é um grande produtor de açúcar, exporta dois terços da produção (do produto), então o real desvalorizado dá competitividade em relação aos outros países. Ela é muito mais positiva que negativa para a gente.
 
Como o setor tem reagido à atual crise?
 
Empresas menos preparadas estão fechando, elas não conseguem sobreviver a isso. Empresas mais preparadas têm enfrentado a crise, como é o caso da Raízen. Nós fizemos a lição de casa, cortamos custos, melhoramos nossa eficiência, estamos preparados para a crise. E as empresas menos preparadas fecharam, demitiram funcionários, enfrentam muitas dificuldades. Por outro lado, você vê que esses progressivos aumentos de preços com relação ao etanol e ao açúcar, por causa da competitividade do real-dólar, têm feito com que muitas empresas não fossem para expansão, mas pelo menos eles dão uma sobrevivência.
 
E a maioria das empresas está sobrevivendo ou fechando as portas?
 
Já fecharam em torno de 60 usinas no Centro-Sul, tem mais de 200, então se você pensar, a maioria está sobrevivendo à crise. As empresas que estão sobrevivendo estão mais fortes. Reduziu-se o número de usinas, mas a quantidade de cana disponível é a mesma, então as usinas complementaram sua capacidade ociosa fazendo com que elas tenham mais competitividade. Então, quando a situação começar a melhorar, a partir do ano que vem, essas usinas vão estar beneficiadas.
 
E essa melhora esperada parte de quê exatamente?
 
Parte dos preços. Essa desvalorização cambial faz com que a gente tenha maior competitividade no mercado internacional, então melhora o preço do açúcar, não em dólar, mas em reais, dando maior competitividade para as exportações. Em relação ao clima, o El Niño provoca secas em alguns lugares produtores de cana, então se eles produzem menos açúcar, é menos competição. Nós viemos de um ciclo muito longo só de superávit (de produção), em que criou-se um estoque. E neste ano, por exemplo, vamos ter déficit, isso faz com que os preços do açúcar subam. Por outro lado, temos também um déficit de combustíveis como um todo, então isso faz com que haja mais procura do etanol, faz com que tenhamos melhores preços.
 
Então essa melhora está mais ligado à dinâmica do setor do que a mudanças políticas...
 
Nós vivemos no livre mercado, nosso único problema é que nosso preço (do etanol) é dependente ao preço da gasolina, que é controlado.
 
E como a crise política atual prejudica?
 
A gente vê que a crise de fundo político faz com que não tenhamos uma política de investimentos de longo prazo. Você vê capital estrangeiro não vindo mais para cá. No passado você via muito capital vindo por causa da confiança no país. O Brasil é uma terra, a médio e longo prazos, muito promissora, mas precisa realmente ter uma estabilidade política. Essa instabilidade cria uma aversão a recursos virem para o país. Os ativos do Brasil, com a desvalorização cambial, ficaram baratos, então só falta essa estabilidade política para atrair o capital estrangeiro.
 
Quanto às políticas voltadas ao etanol, na semana passada, o BNDES apresentou em Piracicaba um estudo para venda de etanol hidratado em contratos de longo prazo. Isso ajudaria o setor?
 
Depende muito de como for desenhado. Toda vez que a gente tenta fazer uma fórmula para um livre mercado, é complicado. Já existe um contrato de álcool anidro, existe uma legislação que obriga você a fazer uma parte em contrato tanto para a distribuidora quanto para o produtor. No caso do hidratado, não existe contrato. Eu não acho que o contrato vá fazer com que exista uma melhora no mercado. O que faz realmente uma melhora no mercado é uma transparência nos preços da gasolina, porque o hidratado, o competidor dele é a gasolina — ou você coloca o etanol hidratado ou coloca a gasolina. O anidro não, é uma mistura, um blend, não depende tanto do preço da gasolina, mas o hidratado depende 100%. E quanto mais você tiver uma política clara de como vão ser os preços, melhor.
 
E esse aumento recente no consumo de etanol hidratado vai motivar as empresas a investirem mesmo com a crise?
 
O aumento do etanol faz com que se tenha mais competitividade. Hoje o etanol está quase 70% do preço da gasolina, faz com que o consumidor consuma etanol, está em um patamar realmente bom em termos de comparação com a gasolina, mas ainda não remunera suficientemente o setor para voltar a investir. Esse patamar de preço nos dá sobrevivência para remunerar o capital já investido e não para fazer novos capitais.
 
Qual seria uma remuneração justa hoje?
 
Hoje o etanol teria de ter aumento basicamente de quase 30% ou ter um diferencial ambiental de 30% em relação à gasolina. Fala-se muito em uma Cide de R$ 0,60 e, se você considerar o etanol em termos de R$ 2 por litro, os R$ 0,60 centavos significam 30%. Esse nível daria uma competitividade melhor para o etanol e os empresários começariam a pensar como investir. Porque o fato do etanol ser um combustível limpo, renovável, ele tem que ter uma figura de prêmio em relação à gasolina. Ou a gasolina ser mais cara em função dela ser mais poluente que o etanol. É isso que a gente espera que o governo faça, não só o governo, mas as entidades que estão ligadas a meio ambiente, aquecimento global, façam com que exista esse entendimento com relação a este aspecto do etanol.
 
Mas está um pouco difícil ter um indicador por parte do governo a respeito disso...
 
Vamos ter a Cop 21 (Conferência do Clima) na França, onde o governo brasileiro terá uma meta de redução de CO2 (Dióxido de Carbono), o mundo vai ter uma meta de redução de C02, e tudo passa pelo combustível, passa pelo desmatamento zero na Amazônia, passa por fazer consumo de mais etanol em relação à gasolina. Para se ter uma ideia, São Paulo há 20 anos ou 30 anos, era tudo escuro, hoje você já vê o sol, o céu limpo, hoje é totalmente diferente, porque tem o carro a etanol. Então tudo isso contribui para o meio ambiente, mas se você não tiver um reconhecimento dessa externalidade positiva, dificilmente o etanol sobrevive, principalmente hoje que o petróleo não está US$ 100 por barril, está metade disso.
 
Mas não há indicação por parte do Governo de que alíquota da Cide volte integralmente agora...
 
O próprio governo brasileiro anunciou que, em 2030, teremos 50 bilhões de litros de etanol. Para se ter essa quantidade ele precisa incentivar a indústria do etanol a fazer novos investimentos, novas fronteiras, aí que eu acredito que haverá um incentivo, ou através de uma Cide, de uma Cide ambiental, ou de um reconhecimento da externalidade positiva do etanol.
 
As duas visitas da presidente Dilma Rousseff (PT) a Piracicaba trouxeram esperança para o setor?
 
Sim, porque a gente quis mostrar para a presidente o quanto o setor está evoluído, o quanto a gente está investindo em tecnologia. Quando a trouxemos para a Raízen para ver a tecnologia de segunda geração, muito mais ver a tecnologia industrial, o quanto ela está evoluindo, ela ficou muito contente porque, no etanol de segunda geração você tem menores emissões de C02 que o próprio etanol de primeira geração (cerca de 17 vezes menos), a gente consegue vender isso melhor do que o de primeira geração. E no CTC (Centro de Tecnologia Canavieira), a gente quis mostrar a evolução da tecnologia agrícola. Tivemos muito retorno positivo dela, porque se vê como estamos evoluindo no plantio de cana, nas novas variedades, até transgências, isso dá uma esperança para o Brasil. Somos uma terra muito rica em agricultura, o Brasil tem competitividade na agricultura, e isso que deu esperança para ela.
 
E como foi a reação da presidente nas visitas?
 
Ela ficou muito emocionada. Ela faz muita pergunta técnica com relação a todas essas evoluções que o setor tem feito e ficou muito entusiasmada com isso, principalmente em um período que antecede a COP 21 na França.
 
E como está atualmente a produção do etanol de segunda geração?
 
Nós instalamos a primeira planta comercial de etanol de segunda geração na (usina) Costa Pinto, está na primeira fase ainda, que é a produção de etanol no C6, que são seis carbonos. Agora é a produção através do C5, isso deve ser finalizado em 2017. Estamos na fase de aprendizado e quando essa planta estiver totalmente pronta ela produzirá 40 milhões de litros (por safra). Esse ano temos expectativa de produção de 3 a 4 milhões de litros.
 
De forma geral, como Piracicaba tem sentido essa crise econômica?
 
Basicamente, Piracicaba, com a vinda da Hyundai e de outras empresas no auge do setor da cana, a cidade cresceu muito. Claro que nesta crise houve uma estabilizada e ela sofre também. Todas as empresas ligadas ao setor sofrem, você tem menos empresas e geração de renda com a crise. Por outro lado, há empresas que tem uma competitividade maior de exportação e vão ser beneficiadas com a desvalorização cambial.
 
As perspectivas para o futuro da cidade são boas...
 
Acredito que Piracicaba sofra, hoje, menos que as demais cidades, mas ela vai acompanhar a evolução do país também. A reação não depende só de Piracicaba e das empresas daqui. Vendemos nosso produto para o Brasil como um todo e vendemos para fora do país, então essa reação vai depender muito do país melhorar e da situação de mundo melhorar também. As perspectivas para a cidade são boas. As expectativas para o Brasil são boas a médio e longo prazos, o importante é você se adaptar neste curto prazo e fazer a lição de casa.
 
Quando o país sairá da crise em sua opinião?
 
Levará uns dois anos. Acredito que 2016 será um ano muito difícil também e, em 2017, a gente comece a se recuperar. Os setores de exportação vão alavancar (essa recuperação), porque houve uma correção do câmbio como um todo. Agora as empresas que têm dívidas em dólar estão com uma situação muito difícil, muito delicada financeiramente.
 
E quanto ao setor sucroenergético especificamente?
 
Nosso setor vive de momentos. É um setor que tem açúcar como commodity e o etanol que depende do preço da gasolina. O setor de commodities é de altos e baixos. Vivemos um período muito ruim durante os últimos cinco anos e a acredito que viveremos um período bom daqui para a frente, começa-se um ciclo bom de três a cinco anos onde teremos uma falta de produto no mundo e nós somos capazes de produzir. E a Raízen é uma empresa bem preparada, bem estruturada, que fez a lição de casa e deve se destacar em um sistema como um todo. Os investimentos necessários sempre foram mantidos pela empresa, mesmo com a crise. Fizemos a lição de casa, terminamos todos os projetos de geração de energia e estamos terminando dois projetos de expansão de usinas, uma em Paraguaçu Paulista (SP) e outra em Caarapó, no Mato Grosso do Sul.
 
Fonte: Jornal de Piracicaba via Nova Cana